O nome de
uma mulher me delata.
Dói-me uma mulher por todo o corpo.
Dói-me uma mulher por todo o corpo.
Ela diz algo de mim, eu digo algo dela
É ela parte de mim, sou eu parte Ela.
Depois dos anos de amor inefável
Saber quem é quem se torna intangível.
Claro que eu sou, ela é, eu é, ela sou
Mas, sobretudo, somos.
Conta-se junto horas, dias, meses
Passamos a ser a medida de nosso tempo.
Tempo e espaço: sem suspeitar,
A corporeidade também nos é feita sob medida.
Na plena confusão de nossos seres
A paixão nos engajou na procura de um impossível.
Na fusão de nossos corpos
Encontramos a continuidade
Perdida de uma vida descontínua.
No infinito de nós dois
A ansiedade e o alívio de ouvir tua voz,
Falando devagarinho, chorando bem de mansinho.
Perto o bastante para sentir
Piscarem os olhos.
De pálpebras cerradas, entrever seu sorriso e suas
tramas
Sorver o fel da dúvida, da infinita volubilidade.
A constância da lembrança daquele olhar
Primordial, cuja promessa eternal se desdobra
No caminho além do desejo e do ato
À alegre hora do beijo e do assalto.
Corpos trançados de esperança e esforço,
Enlaçamo-nos e nos desesperamos.
A beleza para além da receita
Cor do terceiro minuto da aurora
A espera e a memória: “é, já sei, o amor”.
Para a sede e para a fome, o fruto
O milagre para a ruína e o luto.
Cuja rima com dor mora na filosofia,
Alcova dos desabrigados, enlevados
De que tudo isso seja sem ser.
O amor não segue em linha reta
Não há fartura para semideuses.
Sua paixão, em razão da cegueira,
Fatal, mata e faz nascer; (re)nascer.
Começo e recomeço se confundem num tropeço,
Na fumaça de um futuro que não foi.
Buscar o avesso do desamor,
E encontrá-lo no avesso do avesso do amor.
Ante as palavras, antes, inauditas
Canto num silêncio crepuscular
O que resta dos quereres da vida
Que, bem longe dali, vai se acabar.
O poente do meu ser
Repousa em mim mesmo nesta hora.
Que só vai,
Se for pra ver
Aquela cor, só encontrável
No terceiro minuto da aurora.